Era meio dia e fazia calor. Precisei fechar meus olhos um pouco mais, devido a claridade da hora. Vasculhei na bolsa meus óculos escuros. Na parada de ônibus, rumo ao vespertino, aguardavam comigo algumas mulheres, a chegada da condução.
Sem bancos à sombra, posicionei-me distante do sol, mas em meio termo: nem sombra demais, nem luz de menos. Caminhos em linha reta enganam a distância. Daqui ali parece perto, mas, não, quando se para a cada duzentos metros.
Naquele lugar envidraçado, com sujeira seca na janela, gente entra, gente sai, perguntando para onde vai. No meio do caminho, sobe um rapaz, moicano escorrido deitando sobre os ombros, alargador à direita, piercing discreto no septo, fones nos ouvidos, camisa Linkin Park e mochila na mão. Olhos castanhos e pele clara e esguio, pude ler seus detalhes.
Sentou-se dois bancos à minha frente, de onde o contemplei. Belo, mesmo sendo comum. Então, que beleza era aquela? Mas não consegui pensar além de enxergar. O calor, a primavera e o sol deixou tudo mais intenso. O rapaz levou as mãos até os cabelos, na tentativa de se aliviar do mormaço. E daquele jeito, que só os guris sabem fazer, separou e juntou mechas em suas mãos, percorrendo cada ângulo do seu moicano, às vezes de forma suave, às vezes sem jeito.
Aglomerou seus cabelos no alto da cabeça, mas deixou para trás um pequeno rastro de fios lisos escorrendo pela nuca. Passou o elástico em algumas voltas, formando, então, um coque samurai. Aquele penteado dissipado entre homens, que parecem ingenuamente desconhecer seu charme.
A essa altura, não distinguia mais a cena do poema. Meu olhar não conseguia se desviar. Então, ele olhou para o lado e tive a impressão de que desconfiava que estava sendo observado. "Mas ele não consegue me ver daqui", pensei. Olhou, novamente, virando a cabeça um pouco mais para trás, ao que eu imediatamente recorri à paisagem translúcida da janela embaçada. E ele olhou mais uma vez, para se certificar de que não havia alguém. "Estranho", divaguei.
Minha viagem chegava ao seu destino. Levantei-me sorrindo, dirigi-me à porta onde sujeitos desciam e seguiam seu caminho. Paradas vem e vão.
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